Nas colunas anteriores abordei o tratamento dado às crianças e adolescentes antes e depois da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990. De todos os interesses e necessidades regulamentados no ECA, o direito à convivência familiar da criança e do adolescente é o que recebeu maior atenção, pois é tema central das normas do Sistema de Proteção. Mas, não só, a Constituição Federal de 1988 foi responsável por conferir à proteção do direito à convivência familiar da criança e do adolescente a condição e o tratamento jurídico de direito humano fundamental, público, subjetivo e indisponível.
As normas específicas estão previstas a partir do artigo 19 do ECA, que inicia com um dos postulados básicos do sistema de proteção, o da prevalência da família natural. Em diversas passagens, as disposições do Estatuto são incisivas: a convivência familiar significa convivência com a família natural.
É possível perceber a presença no Estatuto de uma noção ampliada do conceito de família, pois família natural não é só a comunidade formada pelos pais, ou por qualquer um deles e o filho, mas comporta todos os descendentes, o que inclui, o neto na família natural do avô e o bisneto na família natural do bisavô.
O conceito ampliado de família natural gera efeitos jurídicos recíprocos, não só na proteção aos filhos, mas também na proteção da linha ascendente. Se pais, avós e bisavós têm obrigações com os filhos, netos e bisnetos, é perfeitamente possível sustentar que a mesma reciprocidade deve estar presente na linha ascendente, que se traduz pelo amparo na velhice, ainda que este não seja propriamente tema do ECA.
Na abrangência do conceito de família natural também estão todos aqueles que, para além da unidade entre pais e filhos, têm parentesco próximo com os quais a criança ou o adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade, o que chamamos de família extensa ou ampliada.
O ECA admite a aplicação das medidas de colocação em família substituta, no entanto, somente excepcionalmente e depois de esgotadas as possibilidades de manutenção ou de reintegração na família natural ou extensa. Ou seja, antes de punir pelo descumprimento do direito à convivência familiar da criança e do adolescente, com o afastamento da criança ou adolescente do lar familiar, busca-se a superação das dificuldades, com o esgotamento das possibilidades de solução por intermédio das providências de auxílio, acompanhamento, orientação e tratamento por parte do Estado, como por exemplo, atendimento psicológico, psiquiátrico, assistência social, inclusão em programas sociais para recebimento de cesta de alimentos, etc.
Importante dizer que o princípio da igualdade jurídica dos filhos orienta a proteção ao adotado, colocando em idêntico patamar a tutela jurídica dos interesses de todos os filhos, com a expressa referência à condição de isonomia aos filhos biológicos e adotados.
Assim, o ECA tem papel fundamental de disciplinar as condições, tratamentos, proteção, garantias e penalidades se houver o desrespeito ao direito da criança e adolescente à convivência familiar, visto que a família é a base da sociedade e tem especial proteção do Estado.